sexta-feira, 11 de maio de 2018

Irregulares e Decididos/as (3) - agressão à mulher e resistência

No começo da semana a direção da biblioteca universitária  de Lusaka (Zâmbia) emitiu uma nota onde intimava as alunas  a "não virem com roupa de semi nuas" porque isso perturba os alunos. Frase parecida com a de um oficial de policia no Canadá, ano passado, ao acusar as vitimas de agressão sexual em virtude de suas roupas. Mobilização imediata na Universidade zambiana pelo direito de cada uma decidir o seu vestuário e a referida direção recuou da medida, tanto mais estupida por se tratar de país da África Austral, a região do mundo com maior numero de mulheres camponeses que não usam roupa da cintura para cima (são milhões). Muita gente mal informada em vários países, acredita que África é toda palco de mutilação sexual da mulher (ablação do clitoris). Falso. Isso ocorre numa faixa saheliana (por vezes com prolongamentos nas respectivas diásporas) e é motivo de resistência, havendo mesmo livros importantes sobre essa luta, por exemplo, o da senegalesa Awa Thiam ("A palavra às Negras") ou da somali Warris Dirie ("Flor do deserto" adaptado ao cinema), além de testemunhos em artigos, entrevistas e livros.

Por outro lado, há zonas da África Central onde se passa oposto à mutilação, ou seja, é a celebração e estímulo do orgasmo feminino, como dado cultural profundo. Recentemente minha amiga Nanda Barros reproduziu um trabalho do nofi.fr sobre o Ruanda onde esta atitude tem inclusive nome: Kunyaza.
O surgimento dos jihadistas em regiões do Sahel - e tentativas em outros pontos (como na Republica Centrafricana, norte de Moçambique, Tanzânia, etc.) - tem aproveitado a tradição de mutilações para impôr mais repressão á mulher, cuja presença é por eles julgada "perturbadora do homem". E também atuam  através de regras repressivas do vestuário, considerando o corpo da mulher como pecaminoso que, portanto, tem de ser escondido.  Ao mesmo tempo, em zonas como o norte da Nigéria e proximidades do lago Chade, fazem constantes raptos de adolescentes.

Tudo isto também provoca natural resistência e alguns grupos usam a imagem erótica ou a auto defesa armada como armas para os contrariar e combater.  Este blog tem dado apoio a essa luta, sob varias formas, inclusive na guerra de imagens, como estas duas de amor e carinho que muito enfurecem o inimigo e seguem  a linha de Kunyaza.
de "Luso Poemas" - site Poetris

                                 de Alicia Rkiho in Instagram, reproduzido em ilustração de poemas por
                                                                                       Anna Lirio Lobo

Mas é justo definir que esse inimigo não se limita a áreas extremas da religião muçulmana, situando-se também em fundamentalistas cristãos ou até pessoas ditas materialistas. Seja como for, estes elementos  são componentes da opressão feminina que, em África, abre caminho a muitos outros e atinge um ponto vital:a segurança. Mas há outros e não só no continente africano. Nesta serie falaremos deles.

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