quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Impasse triturador

 

Este título é tradução livre de " grinding stalemate" usada pelo "Washington Post" para definir o atual contexto de guerra na Ucrânia. No mesmo texto, o jornal refere que o general Valery Zaluzhny vai deixar o Comando geral das F.A. ucrânianas sendo eventualmente substituído pelo tenente-general Kyrylo Budanov, chefe dos serviços de inteligência. A se confirmar pode conduzir ao incremento, ou mesmo prioridade, das ações de guerra assimétrica.

A Rússia falhou sua ofensiva inicial que visava derrubar o governo Zelensky e criar na Ucrânia um quadro político favorável a Putin. Como consequência mudou de estratégia no sentido de ocupar as regiões de língua russa e fustigar as outras com misseis e seu poder aéreo.

Recentemente,  a Ucrânia lançou uma ofensiva visando recuperar territórios, que também falhou.  As defesas russas são muito densas e consistentes, aliás, o mesmo acontecendo com as defesas terrestres ucranianas.

Portanto, a linha da frente congelou. O " Le Monde" constatava há dias que o conflito virou guerra de drones em virtude de ninguém conseguir romper as linhas inimigas. Quer dizer guerra prolongada, aconselhando métodos ditos assimétricos pelo beligerante mais fraco,  na realidade ações pontuais sistemáticas atrás, ou dentro, das posições inimigas. A posse do terreno conta menos, numa situação destas, que destruir material e intranquilizar o efetivo adverso.

A alternativa é a negociação. Esta semana foi noticiado convite ucraniano à China para participar em diligências nesse sentido, estando Pequim em excelente posição pois mantém relações com ambos os lados. Ironicamente, o projeto da União Europeia - usar lucros dos ativos russos congelados  em bancos da U.E. para a fase de reconstrução da Ucrânia - pode sinalizar hipótese de negociação ou elementos de negociação secreta em curso. 

Pelo menos é uma vertente da política oeste-europeia, consistindo a outra no reforço da sua produção de munições, hoje insuficiente sobretudo na artilharia. 

Os Estados Unidos estão condicionados pelo ano eleitoral, no qual o mais provável é fornecer à Ucrânia informações cruciais e esperar que Zelensky use com eficácia o material disponível . A possível passagem às ações pontuais sistemáticas talvez tenha alguma relação com este dado.

O ano de 2024 apresenta também cenários econômicos globais bastante problemáticos e as guerras são uma das causas maiores. Quem revelar capacidade em manter taxas de crescimento consideráveis e, ao mesmo tempo, incidir com força nos setores ou ramos de alto efeito mundial - alimentação, energia, IT e crédito - ganhará relevância. 

Os desempenhos e imperativos econômicos mundiais constituem fator central na construção de alternativas.

  * a foto do início foi tirada de " Vatican News*

Notícias posteriores a este post indicam que Zelensky recuou na mudança de Chefia das suas FA. Mas as divergências permanecem e, sobretudo, o general Zaluzhny não retira a avaliação de impasse na guerra. Portanto, mesmo pelo tempo que ainda fique na posição, alterações do tipo mencionado são prováveis. 

Quanto aos parágrafos do contexto mundial, na minha avaliação não vejo motivo para mudar nada. Assim sendo, mantenho o texto como estava.


                foto também do site " Vatican News"

quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Em Economia

 * Geraldo Alkmin afirma que o programa Nova Indústria Brasil é garantido pelo BNDES sem incidência no Orçamento Federal. 

* A AMSL empresa holandesa maior produtora mundial de máquinas para semicondutores teve no quarto trimestre de 2023 um total de encomendas da ordem dos 9 bi de USD, triplicando em relação ao período anterior. 

* PIB dos Estados Unidos teve crescimento de 3,3% no quarto trimestre do ano passado. 

quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Inteligência Artificial em localização de fake

 A Open AI anunciou ter em fase avançada de construção mecanismos de defesa contra uso da IA de forma incorreta ou mal intencionada. Particularmente  uso em manipulação política e difamação. Nos dispositivos Chat GPT e DALL E 3 serão acrescentados eixos que permitem fazer trace até à origem do texto ou imagem. Segundo a mesma informação na DALL E 3 seria desabilitada a função de usar e modificar imagens de políticos em campanhas.

Além do avanço tecnológico, o anúncio do novo mecanismo é feito no começo de um ano com eleições em 50 países, nos quais há fortes receios de interferências maldosas via IA e técnicas online já existentes. 

Prosseguem também trabalhos no mesmo sentido da coalizão C2PA - Microsoft, Sony, Adobe, Nikon, Canon.



terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Copas da África e da Asia

 Vou acompanhando na TV.

Na CAN fico satisfeito com as vitórias de Cabo Verde (2 a 1 vs Ghana) e Namíbia (1 a 0 vs Tunísia). 



Na competição asiática gostei dos desempenhos do Japão e Austrália.  Arábia Saudita muito abaixo da projeção financeira de seu futebol.

Mas está tudo no começo. 


sábado, 13 de janeiro de 2024

Independentista vence eleição em Taiwan

 Lai Ching-te, do Partido Democrático Progressista, foi eleito presidente de Taiwan com 40,1% dos votos. Em segundo ficou o candidato do histórico Kuomintang com 33,4%. 

Nas legislativas ainda faltavam, há pouco, dados finais para saber se o PDP tem maioria absoluta. 

Lai declarou durante a campanha que Taiwan já é independente com o nome de República da China. Ele é considerado pela China como " sério perigo" e "de guerra". Estas eleições têm  grade impacto geopolítico.



segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

Guerra Econômica. Batalha 1

                            Jonuel Gonçalves

                Litografia e separadores

      na batalha dos   semicondutores



Este artigo é o primeiro de informação geral, fora dos círculos universitários bases de minha pesquisa sobre “Guerras Econômicas do século XXI e efeitos no Brasil”. Refere um campo específico destas guerras, incidindo em capacidades na inovação, níveis de produção (com frequência aproximados, em virtude do segredo que envolve vários produtos sensíveis), faixas de mercado geradoras de alta demanda e incidências recentes no relacionamento internacional e atuação nacional.

 

Antes das reuniões recentes do Presidente dos Estados Unidos e da Presidente da Comissão Europeia com o Presidente da China, as autoridades norte-americanas e europeias lançaram nova lista de restrições à exportação para a China de inovações tecnológicas que possam ter uso militar. As autoridades chinesas, por seu lado, limitam exportações – seja para onde for – de grafite, gálio, germânio e separadores de terras raras, ou seja, para obter materiais estratégicos.

Estes são movimentos recentes de posições na “guerra dos chips”, designação ampla abrangendo, na realidade, quase toda a inovação tecnológica, sublinhando o valor decisivo da pesquisa, produção e distribuição dos semicondutores neste confronto.

Já antes tinha sido constatado um movimento de detalhe – revelador – quando a companhia holandesa AMSL (Litografia de Materiais Semicondutores Avançados) anulou subitamente a entrega de três máquinas topo da gama, ultravioleta profundo (ou extremo), a uma empresa chinesa, embora tivesse licença de exportação. Anulação atribuída a diligências da Casa Branca mesmo antes do decreto que proíbe essas exportações.

O governo holandês oficializou a proibição perto de final de 2023, caindo as autorizações de exportação com validade desde janeiro deste ano para equipamento litográfico tipo NXT:2050i e NXT:2100i, dos quais muito se ouvirá falar em tempos muito próximos.

A AMSL é um caso de estudo interessante por ser a principal - às vezes apontada como única em qualidade –  fornecedora de sistemas de litografia em maquinas  ultravioleta profundo, ponto de partida no fabrico de processadores e cuja capacidade em miniaturizar determina o número de transistores inseridos num chip. O chip mais recente (em princípio, pois com o secretismo pode haver outro) é o M1 da Apple com 16 bilhões de transistores,  atingindo a tecnologia atual  em semicondutores dimensões de dois ou sete nanômetros (nm), portanto entre 2 e 7 bilionésimos de metro, equivalente a algo como um quarto da espessura de um fio de cabelo.

A relativa imprecisão das dimensões alcançadas decorre dos mencionados segredos em resultados de pesquisa, efetiva capacidade produtiva e eventuais narrativas exigindo confirmação.

Seja como for, na litografia mais avançada estamos perante um minigrupo de empresas que insere, além da holandesa, outras duas de grande dimensão e mais algumas com experiencia em semicondutores, situadas numa fase de crescimento para a litografia. As japonesas Nikon e Canon apresentam desempenhos próximos da AMSL, exercendo igual atratividade de investimentos. Todas têm fábricas nos EUA. Além das sedes das três empresas mencionados e dos EUA, há localizações ainda em Taiwan e na China, neste caso com limites na produção de maior desempenho em nanômetros.  

O grupo é mini no número, mas gigante nos efeitos e resultados. Os produtores de chips em todo o mundo dependem desse grupo. Enquanto a muito especializada AMSL tinha valor de mercado em fins de 2023 na ordem dos  270 bilhões de USD, com ações em alta de 930% desde 2013, a Apple, presente em várias etapas do mercado de processadores,   estava na faixa dos 370 bilhões de USD.

Outro ponto capital neste nível reside no intenso trabalho de laboratório, relacionamento com a pesquisa universitária, acordos de intercâmbio com entidades afins de outros países ou espionagem industrial.

A China ainda precisa importar boa parte desses sistemas, embora já esteja muito próximo de atingir os seus pontos mais elaborados. Como país, é 12º no Índice Global de Inovação (IGI 2023), logo a seguir à França, posição conquistada com rapidez e, na soma dos diferentes níveis de semicondutores,  quer dizer, fios que conduzem corrente elétrica na estrutura dos chips, é o maior produtor mundial Não está disposta a se desatualizar na correspondente capacidade de agrupar transistores, topo que a China anda não atingiu no começo de 2024.

Os países mais avançados da União Europeia também recorrem a importação e, até aqui, contam muito com a AMSL, cuja existência e impacto decorrem do ambiente geral que coloca a Holanda em 7º lugar no IGI 2023. A U.E. iniciou ampliação de toda a rede que conduz aos chips mais avançados num programa até 2030, com investimentos de 170 bilhões de USD. Alemanha, França e Suécia possuem pontos de partida importantes, em termos empresariais e de pessoal qualificado. São três países situados nos 12 primeiros do IGI 2023 – Suécia em 3º, Alemanha em 7º, França em 11º - e são todos produtores de viaturas e aeronaves de marcas nacionais e elevada procura mundial.

Nesta mesma situação produtiva, fora da U.E., está o Reino Unido, que o IGI 2023 coloca em 4º lugar. Os níveis altos de pesquisa e ensino em algumas de suas universidades é elemento decisivo na capacidade britânica de já ter atingido grau considerável na produção de semicondutores, em termos de capacidade instalada e sérias perspectivas de sua elevação.  

Um país europeu não membro da U.E., a Suíça, pode fixar-se objetivo semelhante, seja em colaboração com os vizinhos, seja em atividade própria a alguns níveis de relevo.  Situada entre os vinte maiores PIBs mundiais (em nominal), a Suiça ocupa o primeiro lugar no IGI  2023 e vários anos anteriores. A pequena dimensão geo-demográfica deste país não tem influência na viabilidade deste tipo de projetos, na medida em que contam sempre com a escala global. A Holanda já tinha validado este raciocínio.

Elemento limitante da U.E. é sua dependência externa em energia (petróleo e gás), tal como a China, com a enorme diferença desta ter diversificado os fornecedores, ao contrário da U.E.. Além disto, a entidade europeia atrasou de forma imprudente o recurso a energias renováveis, apesar de possuir tecnologia para programas ambiciosos, inclusive em zonas aquáticas, ou seja, reduzindo ocupação de espaços em terra.

Áquela dependência com relação à Rússia dá lugar a outra batalha nas guerras económicas, com gás e petróleo de um lado e sanções bancárias (incluindo congelamento de bens) do outro. Confronto até aqui causador de slowdown em ambas as economias.

Os semicondutores desempenham um papel marginal nessa batalha, porém, colocam a Rússia em maior dependência da China, ao mesmo tempo que se mantem na 51º do IGI 2023, atrás do Brasil.

 

                                            As maiores empresas

Uma unidade de semicondutores da mais recente geração exige um investimento estimado em torno dos 20 bilhões de USD.

Nesta faixa situam-se principalmente a taiuanesa TSMC, as sul-coreanas Samsung e SKHynix, as norte-americanas Intel, Apple, Qualcomm, Texas Instruments. Embora a Texas tenha desempenhado várias vezes papel precursor, as três mais fortes em produção são, conforme rankings sempre alterados pela velocidade das descobertas, métodos e investimentos, a Intel, a Samsung e a TSMC, aparecendo agora a Huawei como candidata a topo, graças a sua crescente participação nos planos chineses de liderança científica e tecnológica, sem ser a única chinesa neste âmbito.

Na Ásia do Sul, a Índia está na fase de fortes estímulos à produção local e projetos empresariais nesse sentido. Algumas unidades médias, voltadas para patamares menos sofisticados, existem em alguns Estados da federação indiana, bancos interessados no crédito setorial e um projeto em andamento de natureza a ganhar dimensão global se for acompanhado pelo crescimento daquelas unidades médias. A norte-americana Micron iniciou os trabalhos para erguer uma fábrica no Gujarat com investimento um pouco abaixo do bilhão de USD, ou seja, bastante menos que os mencionados 20 bilhões requeridos na produção de topo, mas entrando numa dinâmica de crescimento.

Com efeito, a super mineradora indiana Vendata trabalha projeto de 19,5 bilhões de USD e não recuou nem com a desistência de um eventual primeiro parceiro norte-americano.

Israel, Turquia e Iran são três players da Ásia Ocidental que emitem sinais de capacidade tecnológica, não estando alheios a estas possibilidades setoriais. 

Na África, as condições gerais básicas são potente inibidor de inciativas.  Aos limites em recursos humanos e financeiros, acrescentam-se déficits de água e eletricidade, mesmo na África do Sul que possui mercado, incluindo indústria automobilística, trocas comerciais muito influentes em toda a África Austral, algumas startups em IT e círculos científicos relativamente importantes em universidades como Cape Town, Witwatersrand e Stelenbosh.

Os EUA beneficiam, além da atividade de suas próprias empresas e avanço científico, da atratividade de seu mercado conduzir empresas externas a abrirem nele instalações produtivas, tanto nos semicondutores e chips como nos produtos que os vão usar. É o caso da AMSL e do projeto TSMC no Arizona, adiado em virtude da dificuldade em encontrar pessoal especializado disponível, fator que dará lugar a imigração de pessoas com essa especialização, como ocorreu nos programas espaciais.

O protecionismo chinês quanto a minerais estratégicos e separadores de terras raras para os obter, visa assegurar produtos como o gálio e o germânio, mas é válido também para o silício, ainda que outros países possuam conhecimentos equivalentes. O silício tem ponto de partida no tratamento de areia de quartzo através de sucessivos processos, no qual o primeiro é junção com carbono em aquecimento de dois mil graus, até obter pó puro e chegar ao cilindro que será fatiado em wafers, nome decorrente da semelhança com o alimento. Por coincidência, a mesma “imagem alimentar” é aplicada na fase de enriquecimento de urânio designada por “yellow cake”.

A produção mundial de silício deve andar próxima das dez mil toneladas, imprecisão inevitável, devido a estatística disfarçada por razões óbvias no contexto de guerra econômica avançada.

Os maiores produtores em termos extrativos são China, Brasil, EUA, França e Noruega. Das dez maiores empresas produtoras de policristalino, sete são chinesas, uma é dos EUA, uma EUA-Alemanha e uma Coreia do Sul-Malásia. A produção chinesa situa-se em torno dos 70% mundiais, subindo para 80% quando se trata de fornecimento para painéis solares, conforme o Portal Solar (consultado em 04.01.24). No topo dessas dez está a Tongwei, que desde alguns anos ultrapassou a germano-norte-americana Wacker Chemie, hoje em quarto lugar, segundo o referido portal.

O sucesso da oferta chinesa decorre da ponderação qualidade-preço – como também acontece em ramo diferente, o dos inputs base para vacinas. Essa ponderação pode ainda obedecer a cálculo por parte de outros produtores: importar da China a preços favoráveis para preservar suas próprias reservas.

Sobre movimentação comercial do silício produzido, há apenas algumas restrições, pelo menos até aqui. As restrições passam ao patamar de conflito nos planos das tecnologias mais avançadas de produção: separação extrativa e instrumentos para elevar performances finais. Ou seja, nos dois extremos.

Conflito também nos receios de segurança. As proibições norte-americanas, europeias ou chinesas alegam sempre razões de segurança nacional, diretamente sobre estruturas estatais ou nos seus mercados, impondo um secretismo que traduz mais que isso: é inerente à luta pela hegemonia mundial.

A primeira alegação visa obstruir eventual utilização militar dos maiores avanços técnico-científicos. A segunda evitar espionagem, violação dos diretos de propriedade intelectual ou privacidade nos mercados.

As precauções são necessárias, mas sua transformação em barreiras de segurança é, no mínimo, muito difícil. Toda a atividade produtiva é utilizável militarmente. Cantis para água servem tanto para acampamentos de escoteiros como para comandos armados de intervenção rápida. O exército norte-americano é o maior comprador mundial de trigo, como entidade. Determinadas ligas de aço para a indústria pesada tradicional melhoram a eficácia de capacetes e coletes à prova de bala. O cobre serve para condutores elétricos e presença na produção de misseis. Qualquer veículo, incluindo motos e bicicletas, servem para transporte de terroristas e, em regimes ditatoriais, para movimentação de ativistas dos direitos humanos.

Todas as marcas de celulares são passiveis de monitoramento pelo fabricante e, sobretudo, de escuta pelos serviços secretos de qualquer país (à escala nacional) ou interesses privados (à escala setorial). Os drones possuem um equivalente a “caixa preta” em relação constante com o fabricante por razões técnicas quanto à qualidade e estado do equipamento, podendo também servir para monitorar voos.

No caso dos drones, mesmo alguns recreativos podem ter uso militar. Para reconhecimento em qualquer situação ou uso kamikaze em situações de guerra. Em nenhum desses casos o drone recreativo ou profissional civil é o mais adequado a ações militares, apresenta grandes vulnerabilidades, mas a referência aqui serve  de demonstração sobre dificuldade em separar os tipos de utilização. A mesma dificuldade existe até em balões de meteorologia.

O professor Mark Galeotti tem fortes motivos para intitular seu livro de 2021 como “The Weaponisation of Everything: a guide field to the new way of war”, publicado pela editora da Universidade de Yale (versão em português “Quando Tudo é uma Arma”, editora Almedina, 2023)

Assim, como toda a atividade econômica, os riscos estão sempre presentes e são de âmbito largo. A regulamentação desempenha um papel no sentido das proteções nacionais e sociais, porém, as intenções, respeitabilidade dos utilizadores e tipo de relação entre países são mais relevantes.

Outro confronto se passa entre bilionários em inovações geradoras de altos lucros. Um exemplo está patente nos carros elétricos, vistos como fator-chave na transição energética e nas políticas climáticas, estando vários países com legislações que praticamente lhes dão exclusivo no mercado a médio prazo.

Mesmo países sem indústria automobilística interessaram-se pela produção das baterias suscitando corrida ao lítio, podendo prever-se a curto prazo medidas protetoras das patentes capazes de aumentar potencias e autonomia.

A Tesla norte-americana, (com forte presença na China) e as chinesas BYD ou GWB, que se expandem em todos os azimutes, lideram o mercado mundial. Ano passado a Tesla mantinha-se em primeiro lugar com cerca de 1,8 milhões de viaturas, mas no quarto trimestre as construtoras chinesas assumiram a liderança com pouco mais de meio milhão contra um pouco menos do grupo de Ellon Musk.

A tendencia para maior demanda destes veículos incidirá em igual aumento da demanda de semicondutores e de consumo de eletricidade, neste caso com aumento dos postos de abastecimento. Se a atmosfera de rua terá reduzido a poluição decorrente dos fosseis, o consumo destes conhecerá aumento nos países onde a matriz na produção de eletricidade seja de forte componente térmica.

À demanda civil implicando semicondutores tem de se acrescentar a demanda militar, com natural maior vulto nos países de grandes orçamentos de defesa. A diferença norte-americana em relação a seus mais próximos seguidores (Rússia e China) é enorme, em larga medida pelo volume, abrangência e alcance de seu equipamento e bases, mas ainda pelos níveis salariais praticados nas forças armadas dos EUA.

 

                                              Contexto brasileiro

O Brasil está numa fase de desenvolvimento exigindo aumento significativo no fabrico local de toda a escala de processadores. Em termos de semicondutores o país importa cerca de 80% e a produção local situa-se a partir do pós wafer. Pequenas unidades, pouco mais que startups, ou mesmo startups, compõem a rede produtiva e uma unidade estatal de maior dimensão – ou intenções nesse sentido – esteve fechada e foi reaberta no meio de 2023.

Nos grandes indicadores brasileiros de poder mundial, apenas o PIB é de posicionamento alto. No IGI 2023 o Brasil ocupa o 49º lugar, valendo aqui uma observação quanto às desigualdades regionais internas. Como no conjunto do desempenho econômico, também há enorme desequilíbrio nas inovações em favor do Sudeste e Sul.

Porém, a produção industrial e mesmo a envergadura do agronegócio são fatores muito consideráveis de demanda. A entrada em funcionamento de duas unidades de carros elétricos (na Bahia e São Paulo, com investimento chinês), a produção de drones para as forças armadas e o elevado crescimento do respectivo mercado civil, bem como de placas fotovoltaicas, acrescentam a essa demanda.

Por outro lado, o Brasil possui polos de excelência técnico-cientifica, como cerca de dois terços da energia elétrica em origem renovável, capacidade nuclear, duas bases terrestres de lançamento espacial, uma unidade produtora de aeronaves de marca nacional, um centro de pesquisas espaciais com abrangência à meteorologia e alguns núcleos universitários de pesquisa avançada em várias disciplinas. 

No entanto, grande parte do relativo atraso brasileiro decorre do perfil incompleto de atividades que, num país desta dimensão, requerem preenchimento. É assim com os importantes setores agrícola e farmacêutico, nos quais a importação de inputs básicos representam perigo, reduzem o saldo da balança comercial e oportunidades de emprego.

Os semicondutores entram neste perfil, reduzindo mesmo a viabilidade de empreendimentos, num quadro cujas dimensões, recursos e capacidades instaladas, permitem conceber não só o aumento de sua produção, mas até preparar a fase de litografia. A área de mineração, seguindo o exemplo indiano mencionado, é de molde a trabalhar o ramo dos separadores de terras raras e diversificar investimentos para os próprios semicondutores.

Enfim, o Brasil possui um sistema bancário poderoso em capacidade crédito e participação no capital de empresas. O BNDES tem mesmo meios financeiros permanentes acima do Banco Mundial.

 

Conclusões imediatas:

- os semicondutores assumem hoje características semelhantes às chamadas industrias industrializantes das décadas de 1960 e 1970 e, tal como estas, serão superados por novas descobertas. Até lá, fazem parte do caminho incontornável para o progresso constante;

- o escasso numero de produtores na litografia e separação mais avançada de terras raras revela atraso ou lentidão a nível mundial, não sendo de admitir a hipótese de política deliberada de concentração, pois tal não interessa a ninguém. Problemas de recursos humanos altamente qualificados e hesitações perante riscos de capital, ou ainda desconhecimento do valor estratégico de tais procedimentos, parecem explicação mais adequada;

- são produtos que requerem grande abertura de mercados e intercâmbio científico, porém, são objeto de alto protecionismo;

- não há nenhuma contradição de prioridades no desenvolvimento de toda a cadeia de processadores e outros desafios da conjuntura econômica e social. Pelo contrário, é ferramenta estratégica na expansão de ambos os vetores, subida no patamar  de desenvolvimento macro, geração de recursos e eficácia de gestão.  

domingo, 7 de janeiro de 2024

Zagalo

 Minha homenagem póstuma ao grande jogador e técnico, o alagoano Mario Lobo Zagalo, com esta foto da seleção de 1958 e datas de falecimento 


Zagalo foi embora numa fase em que a CBF procurava novo técnico. Diniz foi dispensado e é substituído por Dorival que estava no São Paulo e antes no Flamengo. Bom técnico. 

segunda-feira, 1 de janeiro de 2024

2024

 Se há 40 anos eu tivesse pensado nisso acho que nunca contaria chegar tão longe. Não me lembro de ter pensando. Agora me pergunto até onde irei nesta prova de ultra fundo ou de triatlo ou de voo. Faz tempo que estou na categoria dos ultra fundistas ou tri-atlistas e, mais recentemente, dronista.

Comparando com futebol tenho jogado em defesa cerrada com frequentes contra-ataques e no geral com bom desempenho: ganhei duas guerras ( já explico), um doutorado, vários livros publicados ( também já conto), razoável número de amigas e amigos, me seguro com alguns medicamentos mas raramente vou ao médico.

A vitória nas guerras foi conquistada em luta contra invasores ( históricos ou recentes) e contra dominação de partido único. Ambos sumiram nesses locais,  onde faço parte do campo que alcançou tais objetivos com alegria, enquanto outros apenas os aceitaram com muita relutância até hoje.

A tática consistiu em gerir os riscos do underground ( acho mais forte que "clandestinidade " mas não rejeito esta expressão), sempre ao alcance da boca do lobo que nos farejava, procurava nos atingir mas não localizava nossas posições. 

Pensando em Bob Dylan: nós soubemos muito melhor de que lado sopra o vento.

Para me juntar aos pontos que fizeram crescer liberdade saí de casa e virei adolescente de rua. Não tenho o que reclamar, estava adequado ao combate. Décadas depois, escrevo a partir do que atravessei e de, ainda hoje, ter de chutar umas gentes raivosas dispostas a anular aqueles avanços com deformações, imposturas políticas ou identitarias e calúnias. 

Atenção aqueles e aquelas que hoje nos revezam naqueles pontos: espatifamos os dentes dos lobos que atacam os humanos ( ou têm medo de nós) mas não as garras. 

O doutorado foi um longo e muito interrompido caminho acadêmico em virtude da mencionada rota principal. Muitas vezes estava matriculado mas de repente não tinha como assistir aulas ou apresentar textos.

Já disse algures que uma trajetória  improvisada constantemente - nenhum plano fica inalterado perante o inimigo e, no meu caso, com agravante de grande parte das ações terem sido executadas em solitário - deixa cicatrizes por dentro e por fora.  John Steinbeck escreveu que viver a sério implica ter cicatrizes. 

Bonga diz com música em creolo "Quem que mostra bo esse caminho longe?". 

Então aqui estou, amando a base que escolhi para viver e olhar o mundo - como Clarisse Lispector. Atento às direções do vento. Afetam os meus voos de drone.